Até agora... nos ‘Sobreviventes’ anteriores, foram citados artistas oriundos dos grandes ‘centros’, Rio de Janeiro (Lobão) e São Paulo (Nasi), porém, todos sabemos que o Rock se expandiu para os ‘4 cantos’, atingindo várias camadas da população... mas nem sempre foi assim.
Foi o tempo em que o ‘roqueiro’ era um desajustado, até certo ponto delinqüente. Salvador, “a cidade do axé, a cidade do pavor” (Controle Total, de 1982), foi um dos pólos em que o rock sempre foi marginalizado ao extremo. Raulzito, nas décadas de ‘50’ e ‘60’, junto com sua banda ‘Os Panteras’, era visto dessa maneira... apenas jovens desajustados, com gola levantada, mascando chiclete e topete.
O anos passaram, e já na década de ‘80’, um grupo de jovens (tão desajustados quanto a geração de Raul) sofreu com essa marginalização. Uma banda com nome de “palavrão”: Camisa de Venus, liderada pelo rebelde Marcelo Nova, e que contava com Karl Franz Hummel (Guitarra), Gustavo Mullen (Guitarra), Aldo Boitatá (Bateria) e Robério Santana (Baixo).
Marcelo e o Camisa de Venus, romperam não só com as barreiras da marginalização, mas também com as fronteiras do ‘regionalismo’... atingindo e se estabelecendo nos grandes centros, fato que resulta em pressões de gravadoras para que a banda mudasse de nome, então Marcelo sugere que a banda adotasse o nome de “Capa de Pica”, dessa maneira o nome anterior foi mantido.
Os desafios passaram a ser cada vez maiores, e os feitos também, prova disso é o disco ‘Viva’, de 1986... disco ao vivo, onde não foram ‘limados’ qualquer tipo de obscenidade ou interação com o público, certamente um dos discos mais importantes dos anos 80.
Em 1988, surge um desafio ainda maior para Marceleza: a carreira solo. Lança nesse ano o LP “Marcelo Nova e a Envergadura Moral”, uma referência a seu pai, que dizia que o nome de sua banda (Camisa de Venus), não tinha nenhuma envergadura moral!
Nesse momento da carreira, Marcelo além de alavancar sua carreira solo, encara um novo desafio: reerguer o ídolo Raul Seixas! Marcelo presenciou na infância apresentações de Raul na Bahia, sendo que seu debute em shows de Rock ocorreu exatamente em uma apresentação dos ‘Panteras’. Raul, àquela altura, estava mergulhado no ostracismo, e então passou a encerrar as apresentações de Marcelo, apresentando seus grandes sucessos, além de cantar junto com Marcelo canções como “Rock das Aranha”. Consolida-se então uma grande parceria, canções foram compostas, e os dois ‘rockers’ excursionaram pelo país em mais de 50 apresentações. Raulzito e Marceleza passam então a ser perseguidos por fanáticos religiosos, que na porta dos shows tentavam ‘alertar’ a juventude, que estavam praticamente indo de encontro ao Diabo, caso assistissem a um show desse dois ‘cultuadores do demônio”! A resposta vem na canção “Pastor João e a Igreja Invisível” (mas eu transformo água em vinho/ chão em céu/ pau em pedra/ cuspe em mel/ pra mim não existe impossível/ Pastor João... e a Igreja Invisível). A parceria é encerrada após o falecimento de Raul, em 1989, pouco antes do lançamento de “A Panela do Diabo”... o título do álbum é mais uma pequena “homenagem” aos fanáticos religiosos que tanto pegaram no pé da dupla!
Em 1991 mais uma barreira é rompida, Marcelo lança o primeiro disco totalmente ‘umplugged’ no Brasil: “BLACKOUT”... meu álbum predileto em uma obra tão extensa.
Daí pra frente mais lançamentos foram feitos, o Camisa de Venus se reuniu em algumas ocasiões, como no Festival de Verão de Salvador, em 2004, quando a banda se apresentou para um público exclusivamente adepto do ‘axé music’. Marcelo a certa altura da apresentação se dirige ao público com as seguintes palavras: “aqui ninguém vai cantar ‘vamo sairdo chão galeeeera!’... ‘palminha pra cima... enfia o dedo no C* galera’...”.
Marcelo certamente é um dos artistas mais marginalizados do Rock and Roll, tendo como maiores obstáculos as barreiras do regionalismo, o preconceito com o gênero que apresenta, perseguição de religiosos... apesar de tudo, nos dias de hoje apresenta um show genuinamente Rock and Roll: Violento, com mensagens de reprovação à cena musical, política e social atual, muitos clássicos... desde o primeiro lançamento ‘Camisa de Venus’, até o ‘Galope do Tempo’.
Marcelo pode ser considerado o ‘último dos moicanos’, “fantasma do underground”, ou até um “Estranho no Ninho”... mas acima de tudo um verdadeiro ‘sobrevivente’, dos anos 80... e de tantos outros. Bota pra Fudê Marceleza!!!
As canções de Marceleza, citando uma frase de Franz Kafka, são "machados que quebra o mar gelado em nós". Nada de "música pra adestrar macacos."
ResponderExcluirMuito legal seu post.....Marceleza e um dos ultimos remanescentes do puro rock`n´roll tupiniquim.......adoro ele...
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